São Paulo - Os gêmeos recém-nascidos, filhos do
advogado Eduardo Pugliese, de 37 anos, sócio do escritório Souza, Schneider,
Pugliese e Sztokfisz (SSPS), de São Paulo, tiveram um privilégio garantido a
poucos bebês brasileiros: a presença integral do pai em seu primeiro mês de
vida.
O SSPS é uma
das raras empresas que oferecem licença-paternidade remunerada de um mês,
enquanto a legislação prevê apenas cinco dias corridos de afastamento. “Minha
folga já acabou, mas a de minha mulher continua. Às vezes, comento que gostaria
de trocar: cuidar das crianças enquanto ela trabalha”, diz Eduardo, pai de mais
um menino, de 3 anos.
A velha
divisão das tarefas familiares, na qual a mulher cuida dos filhos e o homem é o
provedor do lar, há muito tempo vem sendo contestada. O aspecto mais discutido
é o direito da mulher de construir uma carreira profissional em pé de igualdade com o homem. Mas
faz parte da mesma discussão o interesse de muitos homens de incluir o
exercício pleno da paternidade em suas tarefas diárias.
Uma tendência que passa pela rediscussão da figura do pai
como responsável único pelo sustento da casa e das consequências que isso traz
para a vida profissional dele.
Profissionais
do sexo masculino têm progressivamente buscado a satisfação de participar do
cuidado dos filhos com a mulher, mesmo que na maioria das famílias elas ainda se dediquem mais nesse quesito.
De acordo com uma pesquisa da Faculdade de Economia, Administração e
Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), entre casais de classe
média em que ambos trabalham fora, a mulher dedica 57% de seu tempo ao trabalho
e 25% à família.
Para o
marido, a carreira ocupa 61% do tempo, e as atividades domésticas chegam a 21%.
Essa diferença já foi muito maior e tende a diminuir. Ambos os sexos gostariam
de reduzir aproximadamente 20% o tempo direcionado à empresa e aumentar 20% a
dedicação à vida pessoal.
O Instituto
Papai, entidade de Recife que milita por uma melhor legislação para os pais,
fez um levantamento com 140 homens de diferentes idades e classes sociais e
descobriu que cerca de 80% deles gostariam de ampliar o tempo de que dispõem
para cuidar dos rebentos.
“É claro que
a equalização dos papéis não vai acontecer nos próximos dez anos, mas percebo a
cada dia mais homens presentes em reuniões de escola, consultas médicas e todas
as atividades relacionadas ao exercício da paternidade”, diz Tania Casado,
professora na USP, de São Paulo, que desenvolveu a pesquisa em parceria com
Érica Oliveira, professora da mesma instituição.
“Pode ser
que no futuro os homens temam por sua carreira da mesma forma que as mulheres
quando se aproximarem da época de ter filhos.”
A eleição de
prioridades atormenta as decisões de pais presentes que desejam crescer na
carreira. Durante todos os anos de graduação de sua mulher, Flavio Crivellari,
de 42 anos, diretor financeiro da Aegea, empresa de saneamento de São Paulo,
saía mais cedo do trabalho para tomar conta das duas filhas.
“Meu emprego
me dava pouco tempo livre, então, para ficar com elas, muitas vezes abri mão de
atividades que poderiam me dar destaque”, afirma Flavio. Quando o casal se
separou, as meninas se mudaram com a mãe para Campo Grande, e para participar
da educação delas Flavio alugou um apartamento na capital sul-mato-grossense,
onde passou 44 dos 52 fins de semana do ano de 2007. Há três anos, as duas
voltaram a morar com ele e, com elas, veio a necessidade de ponderar o tempo
que passa em casa e no trabalho.
Dados do
Instituto Data Popular indicam que 42% dos homens brasileiros não respeitam a
decisão de outros homens de abandonar a carreira para cuidar da casa, enquanto
78% deles respeitariam se essa decisão fosse tomada por uma mulher. Superar
esse preconceito fez parte da história de Claudio Santos, de 42 anos,
ex-executivo de relações institucionais da montadora Renault, que decidiu
abdicar da própria carreira para acompanhar a mulher numa expatriação.
“Aceitei não
ser mais o provedor da família, papel que fui educado para exercer, mas me
sentia fora do clube do bolinha, porque parecia que os outros não me viam como
um sujeito normal”, diz Claudio, que hoje vive com a família nos Estados Unidos
e é autor do livro O Macho do Século 21. “Não há mais lugar para
tarefas definidas de acordo com o gênero, e eu admiro as pessoas que conseguem
superar o enorme desafio de conciliar a carreira com a educação de uma
criança”, afirma Claudio.
Mas a
decisão não precisa ser tão radical. Compartilhar papéis domésticos contribui
para que nenhum dos cônjuges tenha a carreira prejudicada. O carioca Alexandre
Vilela, de 42 anos, gerente de projetos institucionais do laboratório
farmacêutico Pfizer, de São Paulo, divide uniformemente com a esposa não apenas
as despesas mas também as responsabilidades domésticas e o tempo dedicado aos
dois filhos.
Como ambos
têm profissões parecidas, quando um precisa ficar até mais tarde no escritório,
ou viajar a trabalho, o outro assume o avental e todas as atividades
envolvidas. “As crianças nos impulsionam a ser melhores profissionais, trazer
melhores resultados, que vão refletir no orçamento da família”, afirma
Alexandre.
“Ao dividir
as tarefas da casa, minha esposa contribui para meu crescimento da mesma forma
que eu contribuo para a evolução dela.” Além do impulso para galgar melhores
salários, a paternidade tem outros impactos positivos na carreira, como o maior
senso de responsabilidade que o profissional adquire. “Quando se está habituado
a lidar com questões domésticas, não há problema corporativo que não possa ser
resolvido”, diz Claudio. A convivência com os filhos torna a paternidade
fundamental não apenas para a criança mas também para o executivo.
“O profissional
feliz e completo fica mais motivado para batalhar pela satisfação na carreira”,
afirma Jacqueline Resch, consultora da Resch Recursos Humanos, do Rio de
Janeiro. “Conviver com minhas filhas me humaniza; me sinto emocionalmente
seguro e equilibrado para trabalhar em um mercado cruel e pragmático”, diz
Flavio, da Aegea.
Licença maior
A legislação
brasileira prevê afastamento de cinco dias corridos para pais em caso de
nascimento de filhos. Entretanto, esse período poderá ser alterado. Atualmente,
tramitam no Congresso dois projetos de lei que estendem a licença. Um deles
para 15 dias (parado no Senado), outro para 30 (travado na Câmara). Em 2013, 70
países legislaram a respeito do tema.
“Deveria
haver pelo menos seis meses de licença, período que poderia ser dividido a
critério dos cônjuges, como muitos países desenvolvidos já fazem”, afirma
Mariana Azevedo, coordenadora do Instituto Papai, de Recife. Trata-se de uma
luta que interessa também ao sexo feminino. “A atual situação desfavorece as
mulheres, que ganham menos e ficam expostas ao risco de não conseguir emprego
caso queiram engravidar.”
O maior
desafio para os homens nesse cenário é administrar a carreira enquanto são
também participativos na família, como as mulheres já têm feito. Para ter
sucesso ao assumir múltiplas tarefas, é preciso saber ocupar bem o tempo: ser
mais produtivo durante o expediente para não precisar fazer horas extras que
seriam destinadas às crianças.
A Associação
Brasileira de Recursos Humanos (ABRH) calcula que cerca de 40% das empresas
oferecem algum tipo de benefício para facilitar a rotina dos executivos, como
home office, horários flexíveis e creche corporativa.
“Cobramos
pela qualidade das horas trabalhadas, não pela quantidade”, afirma Irene
Camargo, diretora de RH da Pfizer. Lute para que sua empresa também lhe ofereça
a oportunidade de ser um melhor pai. Na carreira e na vida, você só terá a
ganhar.
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