O país pode estar perto de
vencer parte das barreiras que dificultam a vida do cidadão e das empresas na
busca por uma justiça mais ágil, eficaz e transparente. O novo Código de
Processo Civil (CPC), que em breve será sancionado pela presidente Dilma Rousseff,
foi concebido para reduzir as angústias de quem muitas vezes espera décadas
pelo desfecho de uma ação judicial volumosa, em linguagem complicada e guiada
por regras que legitimam e até estimulam o conflito.
A votação do novo CPC foi concluída em 17 de
dezembro no Plenário do Senado. Desde então, o texto se encontrava em revisão
para ajuste de técnica legislativa e de redação. Agora, com o encaminhamento à
Presidência, o prazo máximo para a sanção é de 15 dias úteis.
O texto que
está sendo enviado ao Planalto pelo presidente do Senado, Renan Calheiros,
incorpora soluções que devem ajudar a destravar a máquina do Judiciário. Uma
das mais importantes é a criação de centros de solução consensual de conflitos
em todos os tribunais, o que deve resultar na troca da atual visão litigiosa
pela busca da resolução pacífica das demandas. Nas audiências
prévias de conciliação, as partes
serão ouvidas e estimuladas ao acordo. As ações só vão prosseguir quando não
houver entendimento.
No dia da aprovação final no Senado, Renan
disse que a reforma do código atual, em vigor há mais de 40 anos, era urgente e
necessária, pois seu texto permanecia desatualizado mesmo depois de sucessivas
reformas.
— O código atual é pródigo em permitir inumeráveis
recursos que prolongam indefinidamente o processo e obstam a entrega da
prestação jurisdicional, que significa, em uma expressão simples, fazer justiça
— declarou.
Ampliação de multas
O atual sistema de recursos é de fato
reconhecido como um dos obstáculos à celeridade dos processos na esfera cível,
que abrange matérias relativas às pessoas, os atos e negócios jurídicos, bens e
direitos, contratos e relações de família. Como resposta, o novo texto extingue
diversos recursos e restringe o uso de outros. Além disso, foram elevadas as
multas para punir o mau uso desses instrumentos, quando manejados apenas para
atrasar os processos e assim adiar a hora da sentença.
Desde a Reforma do Judiciário, em 2004, a
Constituição passou a abrigar o princípio da “duração razoável do processo”
entre as garantias fundamentais do indivíduo. Porém, para que esse primado
pudesse ganhar expressão concreta, ainda se fazia necessário a reforma de leis
infraconstitucionais, como o próprio CPC, que trata da aplicação das normas de
Direito Civil no âmbito do processo judicial.
A iniciativa de deflagrar a modernização do
CPC foi do então senador José Sarney, que na Presidência da Casa em 2009
instituiu uma comissão composta de juristas para elaborar o anteprojeto. A
comissão foi presidida pelo agora ministro do Supremo Tribunal Federal (STF),
Luiz Fux, que à época integrava o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A comissão de juristas apresentou um
anteprojeto de lei que passou a ser analisado por uma comissão especial de
senadores. Convertido no PLS 166/2010,
o texto foi então a exame da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania
(CCJ) antes de ir a Plenário. Aprovado, foi encaminhado à Câmara dos Deputados,
onde recebeu alterações, como as regras especiais para favorecer a solução
consensual de demandas no âmbito das ações de família, com previsão de apoio
multidisciplinar para ajudar os envolvidos, inclusive de psicólogos.
De volta ao Senado, em 2014, na forma de um
substitutivo, o projeto passou mais uma vez pelo exame de uma comissão especial
de senadores. Depois, seguiu diretamente a Plenário, em dezembro passado, para
votação final. O novo CPC, o primeiro a ser elaborado em plena vigência de
regime democrático no país, tramitou no Congresso por mais de cinco anos.
O CPC vigente foi editado em 1973, durante o
regime militar. Foi obra concebida pelo então ministro da Justiça, Alfredo
Buzaid. O anterior nasceu no contexto ditatorial do Estado Novo, sob o comando
de Getúlio Vargas, em setembro de 1939.
Transparência
Entre as inovações do novo CPC que valorizam
transparência está a imposição de julgamento dos processos judiciais em ordem
cronológica fixadas a partir do momento em que ficam prontos para exame e
decisão. Continuam tendo preferência, contudo, os processos e atos com
preferências legais, caso das ações de interesse de idosos e pessoas com
deficiência.
A lista de processos prontos para julgamento
deve também ficar disponível para consulta pública. Também em favor da
transparência, o texto exige que os juízes detalhem os motivos de suas
decisões, não bastando transcrever a legislação que dá suporte à sentença.
Houve polêmica em relação a pontos
divergentes entre o texto inicialmente aprovado pelo Senado e o substitutivo
oferecido pela Câmara. Na casa revisora, por exemplo, foi aprovada na votação
final em Plenário uma emenda que impedia o bloqueio e penhora antecipada de
dinheiro, aplicações financeiras e outros valores de devedor, para assegurar
futuro pagamento de crédito cobrado por terceiros.
Na volta ao Senado, a regra que permite a
penhora, já presente no CPC atual, acabou sendo restabelecida. Por outro lado,
na votação final em Plenário, saiu do texto dispositivo que atribuía aos juízes
poder para determinar a intervenção judicial em empresas, para fazer valer uma
sentença com obrigação a cumprir.
Em outro ponto, o novo código agora define
procedimentos para a desconsideração da personalidade jurídica das sociedades,
medida que pode ser adotada em casos de abusos e fraudes. Assim, os
administradores e sócios respondem com seus bens pelos prejuízos. Hoje os
juízes se valem de orientações decorrentes de decisões repetidas de julgamento
anteriores (jurisprudência).
Conquistas para advogados
A classe dos advogados conseguiu assegurar
novas conquistas no novo código. Os profissionais, por exemplo, agora terão
tabela de honorários aplicável às ações vencidas contra a Fazenda Pública, com
tabela de acordo com faixas sobre o valor da condenação ou do proveito
econômico. Havia queixa antiga de que os juízes sempre fixavam valores
irrisórios. Os honorários também serão pagos na fase dos recursos.
Mesmo havendo
posição contrária do governo, os advogados públicos conseguiram a garantia de
ganhar, além da remuneração do cargo, honorários quando obtiverem sucesso nas
causas. Se passar pelo exame da presidente Dilma Rousseff, que tem poder de
veto, a conquista ainda deverá ser regulamentada em lei futura, que definirá
condições e forma de pagamento.
Para que os advogados tenham férias e não
percam prazos processuais, os processos ficar]ao suspensos de 20 de dezembro a
20 de janeiro. Nesse período também não haverá audiências nem julgamentos,
sendo mantidas as demais atividades exercidas por juízes, membros do Ministério
Público, da Defensoria Pública e da Advocacia Pública, além dos serviços dos
auxiliares da Justiça.
Participação
O texto também regulamenta a intervenção do amicus curiae em causas controversas e relevantes, para colaborar com sua experiência
na matéria em análise, em defesa de interesse institucional público. Poderá ser
uma pessoa, órgão ou entidade que detenha conhecimento ou representatividade na
discussão. A participação poderá ser solicitada pelo juiz ou relator ou ser por
eles admitida, a partir de pedido das partes ou mesmo de quem deseja se
manifestar.
Fonte:
http://www12.senado.gov.br/
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