Por Isadora Barbosa
Nos últimos tempos, o que mais tenho ouvido das pessoas é que
mudei. Concordo com elas. Mudei sim. Talvez não tenha sido algo positivo para
algumas pessoas, mas certamente foi para mim.
O meu
lado bobo, emotivo, pouco racional e que se ganho, doava-se com a maior
facilidade deve fazer falta, mas tive de mudar. A vida me obrigou a desistir do
meu lado mais angelical, as pessoas me obrigaram a abandonar o gosto doce que
eu trazia comigo para todo canto que me propunha a ir.
Tive
de mudar por mim, porque algumas pessoas e coisas deixaram de valer à pena.
Acontece. O papel de mocinha não estava me caindo bem e acabou por ficar
impossível contar os travesseiros inundados que tive de jogar fora.
Acontece
que quando se engole muito do que te oferecem você acaba aprendendo a
diferenciar o bom do ruim. Algumas vezes, por pura consideração e falta de amor
próprio, você até aceita o bolo solado e o café aguado daquele velho amigo, mas
tem dias que a dor no estômago é tão forte que você acaba tendo de aprender a
dizer não.
E eu
aprendi, depois de tantos tropeços, eu finalmente aprendi.
Aprendi
que se uma dor causada não vale o bem que se tem em troca, melhor desfazer-se
do sentimento que existe. Algumas cicatrizes coçam, doem, principalmente se faz
frio, mas algumas feridas abertas são capazes de infecções quase incuráveis.
Estou
mais analítica. Não dou o braço a torcer por qualquer coisa, nem ando por aí
discutindo a minha razão e a dos outros e, se choro hoje, é para não esquecer
de seguir em frente no dia seguinte. Os olhos inchados não caem bem na frente
do espelho e de outras pessoas.
Estou
mesmo é cuidando de mim e dos que me querem bem. Digo sempre ao Zé que se
alguma coisa aprendi na vida, foi a não tentar anestesiar feridas emocionais
com pequenas mentiras. O efeito colateral é tão agressivo que causa nódulo na
alma.
Algumas
pessoas são como ervas daninhas. Nascem no momento mais inoportuno e ganham
espaço, cor, vida a custo de nossa felicidade. E como grandes amantes da
ilusão, aceitamos bofetadas acreditando serem flores. Nossa natureza é tão
esperançosa que sempre crê em segundas chances, na possibilidade de uma mudança
repentina numa história que já veio com prazo de validade. Nossa natureza é tão
apaixonada que se comove com simples palavras meticulosamente ensaiadas na
frente do espelho. Palavras que parecem traduzir o desejo mais íntimo do ser
humano, esse ser abobalhado e encantado com o amor, com a possibilidade do
amor, caindo no conto do vigário que algumas estórias tomam por encantadas. E
nesse grande espetáculo onde atuamos dia após dia, parecemos esquecer que de
encantado na vida são mesmos só os livros, os filmes e as músicas. A vida é
esse grande e mal cheiroso balde de merda que se come pelas beiradas, como
disse o grande Bukowski.
E se
mudei, entenda, foi por ter passado tanto tempo me deixando levar por contos de
carochinha, na espera infantil de um grande e único amor, de uma amizade que
fizesse do
“para
sempre” um estado atemporal, de alguma coisa que findasse em ponto final, mas
como todo bom sonhador, bater a testa na parede foi o único retorno saudável
que tive.
Não
estou impossibilitando um grande amor, uma grande história, nem me rebelando
contra boas amizades. Não estou fechada para nada nem ninguém. Um amor cairia
até que muito bem agora. Desses amores que não precisam de status, provas, de
inúmeras palavras. Um amor para dois, que não precisa de público, de ensaios,
que tem tropeços, mas muita compreensão. Um amor maduro que sabe-se existente
por simplesmente crê-se ali, que existe nas entrelinhas. Um amor desses que faz
carícias com os olhos, onde o sexo está em segundo plano e a companhia é tudo
que se precisa para viver em paz. Um amor desses que não exige, que não cobra,
porque a confiança é o que os mantêm unidos. Um amor que não tem erros, mas
defeitos e qualidades capazes de serem superados. Falo de amor, entende? De
amor que não maltrata, não recrimina, não abusa, não ofende. Amor, sabe? Amor
que se guarda na prece mais silenciosa feita à Deus.
Se
mudei, repito, mudei porque foi preciso. Mudei porque não aceito esmolas, não
imploro pelo amor de ninguém, não quero metades, nós, amarras. Mudei porque
reconheci em mim a necessidade da mudança e assim o fiz. Mudei porque já não
competia a eu carregar nas costas o sentimento torto de quem não reconhecia o
que eu ofereci. Mudei e a mudança foi à prova viva de que crescer não é
desaprender, não é deixar de se ser, mas lapidar o que temos em nós no melhor
que podemos ser.
E se
hoje exerço o papel de vilão na vida de algumas pessoas, certamente é porque
não aceito estar em segundo plano na vida de ninguém.
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