Estimulando
criatividade, alimentação saudável, amor à natureza e equilíbrio espiritual, a
antroposofia está mostrando que é possível viver melhor e mais feliz, como nos
velhos bons tempos
Reportagem: Aline Salve - Edição: Amanda Zacarkim
A antroposofia está fascinando muitos brasileiros. Pelo
menos 700 médicos utilizam-se de seus princípios, recorrendo a chás e outras
receitas caseiras e evitando o excesso de medicamentos. E já há 13 escolas,
disputadíssimas, nas quais as crianças aprendem primeiro a viver a vida,
envolvidas em atividades realmente infantis, em vez de serem preparadas para o
mercado de trabalho. Existe também um grande laboratório (Weleda), que fabrica
remédios, chás e cosméticos naturais, uma editora (Antroposófica), com dezenas
de títulos publicados, e até o luxo de uma rede de produtores agrícolas
biodinâmicos, que fornece queijos, iogurtes, pães, verduras e frutas de
qualidade.
Criada no começo do século XX pelo filósofo
austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), essa ciência humanista vem sendo aplicada
em áreas tão diversas como medicina, educação, agricultura, economia,
farmacologia, teatro e artes plásticas, organização social e espiritualidade.
Ao pé da letra, trata do conhecimento (sofia, no grego) sobre o ser humano (antropos).
A antroposofia acredita que é preciso desenvolver
o homem integralmente, considerando sua alimentação, moradia, relacionamentos
sociais e econômicos, bem como sua formação intelectual e sua espiritualidade.
Um rio de obviedades, com as quais a maioria de nós concorda perfeitamente. A
diferença é que os seguidores da antroposofia não apenas concordam como agem de
acordo, na contracorrente, mostrando que é possível compor e manter uma
sociedade alternativa mesmo dentro das grandes cidades.
Uma pedagogia que respeita a alma
Aos nove anos, os alunos plantam trigo, colhem,
moem a farinha, preparam o pão em forninhos de barro que eles próprios fizeram.
Assim, aprendem uma das lições do tema "de onde as coisas vêm", que
compõe o conteúdo nesse período. Quando aprendem a escrever, fazem o caminho do
calígrafo - experimentam o lápis, a pena de ganso, a caneta tinteiro. As aulas
de História falam também de lendas e mitos - como o de Atlântida, o continente
que foi engolido pelas águas, citado por Platão. O violino, um dos instrumentos
mais usados nas classes, estimula a área ao redor do peito - assim, as cordas
fazem vibrar o coração, o que promove o despertar das emoções. "Tudo é
pensado para acompanhar o desenvolvimento anímico, energético e espiritual",
explica Celina Targa, professora da Escola Waldorf Micael, em São Paulo. A
escola antroposófica não é feita para pais ansiosos (a alfabetização, por
exemplo, só acontece no ano em que a criança completa sete anos).Os pais são
convidados a participar, e muito, de todas as atividades. "Pode até se
dizer que eles se matriculam junto com o filho", diz Celina.
Espiritualidade na plantação
Outro ramo importante da antroposofia é a
agricultura biodinâmica, que, além de ser orgânica (não utiliza adubos,
aditivos ou inseticidas químicos), também respeita o caráter energético e vital
dos alimentos. A plantação recebe diferentes "preparados". Há
fórmulas de inspiração homeopática com base em substâncias naturais como
cristal ou esterco, às quais se atribui o poder de concentrar energias. Os
insetos podem ser combatidos com o cultivo de vegetais que os afugentam ou, de
novo, com preparados energéticos. Os ciclos e influências planetárias também
são considerados. Para completar, é comum o agricultor antroposófico ser alguém
que se exercita nas artes, que faz teatro e medita. Ele é o que se pode chamar
de um homem integral, tal qual sua plantação.
Um dos pioneiros dessa história é o gaúcho Paulo
Cabrera, que administra a Estância Demétria e o Sítio Bahia, áreas de agricultura
e criação biodinâmicas em Botucatu (a presença da antroposofia nessa cidade é
marcante). Assim como quase todos os professores e agricultores Waldorf, ele se
especializou na Europa - no caso, o prestigiado curso de Agricultura do Emerson
College, na Inglaterra. Cabrera produz vários tipos de laticínios, pães,
geléias e mel. "O mais importante é que conseguimos preservar os
princípios antroposóficos na maneira de ser. Montamos peças de teatro no Natal,
Páscoa e Pentecostes. E temos aulas de euritmia, que trabalha a parte
emocional", conta ele. "O sentido mais profundo do nosso trabalho é
desenvolver a consciência e a espiritualidade".
Apesar de muitos princípios e crenças, a
antroposofia não é dogmática, não exige comprometimento total com suas cartilhas.
Também não é seita, nem clube de associados, o que a torna simpática aos novos
seguidores. Ao que parece, o conhecimento deixado por Rudolf Steiner está se
consolidando naturalmente porque é uma fonte de soluções de bom senso para
todos que percebem as relações entre o Homem, o planeta e o divino. E tem mesmo
muito a ver com nossas avós. A antroposofia recupera o lado feminino, é o lado
do amor, da proteção, do cuidado.
ONDE ENCONTRAR ANTROPOSOFIA
LIVRO
Noções Básicas de Antroposofia e Pedagogia Waldorf,
de Rudolf Lanz, ambos da Editora Antroposófica
ESCOLA
Waldorf Micael, São Paulo, recebe pais
interessados em conhecer o local e os métodos de ensino: (11) 3782-4892. A
Waldorf Rudolf Steiner, também em São Paulo, é pioneira da pedagogia
antroposófica: (11) 5523-6655
SITE
Boas informações podem ser obtidas no site www.sab.org
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